O cavalo do presépio do Colombo
- Inês
- 10 de jan. de 2019
- 4 min de leitura
Atualizado: 15 de jan. de 2019

Janeiro, o primogénito dos meses, o das retrospetivas nostálgicas e o das resoluções anuais que duram em média 3 dias. Por esta altura a época de desistências do ginásio já deve estar oficialmente aberta e o livro, há duas semanas em cima da mesa de cabeceira, mostra os primeiros sintomas daquilo que virá a ser uma consistente camada de pó. Para reforçar o meu ponto de vista, decidi só me pronunciar sobre este assunto 10 dias depois do que seria esperado, não fossem os leitores pensar que em 2019 vou ser uma blogger dedicada. Seria uma honra, mas vai ter de ficar para outra altura, a culpa não é minha, não fui eu que decidi que as resoluções não são para cumprir, é tradição. Pelo lado positivo, enquanto ser respirante neste belo ano já vos posso dizer o que é que estou a achar, que é mais giro do que inventar expetativas só para se tornarem desilusões. Para surpresa de absolutamente ninguém, tudo começou à meia noite, com fogo de artifício e champanhe envolvidos, eu sei, não estavam à espera desta. Mas antes de relatar o momento eufórico em que deixei o magano do 2018 para trás, ainda tenho algumas notas finais para apontar à criatura.
Eu até compreendo as desilusões e contrariedades da vida, são importantes para uma pessoa crescer e tal, além de que chorar faz bem à sinusite. A um certo ponto até já estava a gostar das frustrações acumuladas, e das facadas impiedosas no lombo. Nem me posso queixar, só fui assaltada uma vez, psicologicamente espezinhada por sete pessoas diferentes e chumbada em exames de condução um número nada embaraçoso de vezes. E claro, não posso deixar de mencionar aquela vez em a ASAE decidiu ir abanar o capacete na festa que passei 2 meses a organizar. Pessoas simpáticas os inspetores, gostaram tanto que queriam fechar a festa para a terem só para eles. Eu, o resto da comissão organizadora e as 600 pessoas que lá estavam teríamos adorado, aliás, adorámos a multa que chegou como recordação uns meses depois. Isto é tudo muito giro e agora até tem piada. Quem sabe não inspire um livro de anedotas ou uma autobiografia, aparentemente as diferenças não são muitas. Mas querido 2018, seu hilariante diabrete do destino, lágrimas dos meus olhos, sofrimento do meu coração, tinhas mesmo de te armar em *inserir linguajar rude à escolha* no último dia da tua malfadada existência? Quer dizer, uma pessoa vai toda feliz para a praia, de câmera em riste e olhar reflexivo de quem se prepara para encontrar o sentido da vida num só anoitecer. E tu, que nunca tiveste pressa para deixar de me importunar, decides despachar o pôr do sol cerca de dois segundos antes de eu tocar com a pontinha do pé do areal. Não sou de intrigas, mas 2019 começou logo a marcar pontos no momento em que teve a gentileza de me deixar ver o seu primeiro sol poente. Apesar de tudo, tiveste os teus momentos e tenho a certeza de que te deixei mais forte e confiante do que quando te conheci. Faltava pouco para a meia noite quando decidi escrever uma carta sobre ti, sentada no sofá, enquanto a alegria dos meus amigos aumentava e a quantidade de bebidas alcoólicas diminuía, não o teria feito se não tivesses sido tão importante. Obrigada por tudo, foste, de uma forma desvairadamente imprevisível, o pior e o melhor ano da minha vida.
Quanto a 2019, ainda não tenho nada a apontar, deixem-me só chegar à semana de frequências, que eu logo volto com reivindicações fresquinhas. Mas como isto não pode ser só drama e infortúnios, seguem-se umas linhas de otimismo e acontecimentos agradáveis, não se habituem. Acho que a primeira grande conquista do ano, quase tão importante como os feitos de Vasco da Gama, foi a descoberta do caminho terreste para um estacionamento eficiente, ainda por cima num dia de nevoeiro. Claro que D. Sebastião não podia perder a primeira vez que conduzi sozinha, foi épico e ao contrário dele, sobrevivi e regressei. Quase tão icónica como a minha cruzada com cavalos a motor, foi a passada segunda-feira. Tudo começou quando a minha sócia, amiga e colega de casa, escolheu o meu visual. Apesar de estar condenada a usar uma bata branca, a aspirante a enfermeira veste preto na generalidade dos dias. Ela é o tipo de pessoa que ouve músicas com pessoas a gritar, daquelas cujas capas dos álbuns são fetos mortos, pessoas amputadas, a encarnação do satanás ou outra qualquer figura do mal, por isso dá para ter uma ideia das roupas que ela me escolheu. O dia correu sem sobressaltos, até que chegou a hora fatídica em que tivemos de ir ao Colombo. Tinha acabado de comprar um unicórnio, substituto possível para o cavalo que queria dar ao meu amigo secreto, quando a catástrofe aconteceu. Estávamos à procura da saída, perdidas, como a maior parte das pessoas não descendentes de morcegos que frequentam o Colombo. O presépio, ainda montado debaixo da imponente árvore de natal, chamava por nós com uma aliciante voz angelical. Foi aí que o vimos, um cavalo branco, ainda mais perfeito do que o que tinha imaginado comprar. E foi assim que eu, pessoa que nunca roubou mas já foi assaltada, alma do bem, ex-escuteira, roubei um dos cavalos do presépio toda vestida de preto. Não julgo os leitores que estão neste momento a considerar fazer queixa à polícia, ou pior, deixar de me seguir, mas a história ainda não acabou. Claro que quando acordei no dia seguinte e vesti a minha camisola cor de rosa com lamas, percebi imediatamente a gravidade dos meus crimes, a culpa foi da roupa. Contudo, apeguei-me ao nobre corcel, é sem dúvida a melhor peça de decoração que tive desde a radiografia da cadela Cookie, encontrada debaixo de um colchão quando me mudei para Lisboa. Por isso, numa tentativa de compensação, decidi doar um unicórnio ao presépio. Podem ter a certeza que as purpurinas e a crina rosa acrescentam qualquer coisa à magia deste Natal tardio. Espero que 2019 seja tão belo como o puro sangue inglês que agora me alegra a vida e o hall de entrada da minha humilde habitação. Bom ano, queridos leitores, para a frente, a galope.
Nota do autor:
Se gostaram deste texto ou simplesmente querem saber se cheguei a ser presa, não se esqueçam de seguir o blog nas redes sociais. Caso trabalhem no Colombo, isto é tudo um sonho, vocês não leram nada.
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